sexta-feira, 24 de abril de 2009

QUEM NÃO PRECISA DE TEOLOGIA?

“O homem não sabe em que lugar colocar-se. Está visivelmente perdido e caiu de seu lugar sem conseguir reencontrá-lo. Busca-o por toda parte com inquietação e sem êxito em meio a trevas impenetráveis”. (1) Blaisé Pascal.
“O fim de um teólogo não é deleitar ouvidos, com arguir loquazmente, mas firmar as consciências, em ensinando o verdadeiro, o certo, o proveitoso.” (2) João Calvino.

Lembro de conhecer alguns indivíduos que sentem verdadeiro pavor à Teologia, para eles é até pecaminoso estudar Hermenêutica, Exegese, Homilética e etc... O que dá “IBOPE” (segundo tais pessoas) é ter um grupo musical que execute bem as músicas “gospel” do momento. Nada de pregar sobre: arrependimento; santificação; testemunho cristão, nem pensar em pregar as doutrinas da Graça - aliás, quanto às doutrinas, não se deve nem pensar nelas, quanto mais pregá-las. Este é o espírito anti-dogmático da parcela brasileira da igreja dita “evangélica” que não está nem aí para a Teologia.
Já ouvi certo cidadão dizer que não suporta Teólogos, pois estes já lhe deram muitos problemas. Alguém poderia pensar que Teólogos são pessoas intransigentes, carrancudas e promotoras de divisão, por isso causam problemas. No entanto o que foi constatado é que os problemas que os pobres difamados, que gastam de 4 anos e meio a 9 anos estudando as Escrituras (somente estudo formal acadêmico, a maioria dos Teólogos, no entanto, estuda a vida inteira) causam, é confrontar pessoas que usam “O Príncipe” de Maquiavel como seu próprio texto “teológico”, aprendendo assim através deste piedoso modo de viver e pensar, (nunca, nunca ensinar), para então conduzir seu “Movimento dos Sem Bíblias” da forma como bem entendem.
Surge então a pergunta, quem precisa de Teologia? O que importa é fazer a obra do Senhor. Dizem eles: na verdade, discussões sobre assuntos dogmáticos devem ser descartadas, pois não trazem edificação, temos que ser espirituais, e pessoas espirituais, não lêem livros como: O velho Hodge, menos ainda Franklin Ferreira, tão pouco se familiarizaram com João Bunyan. Estas leituras são para os não-espirituais. Disse certo homem um dia: Não formamos teólogos, formamos obreiros. Quero discorrer sobre isso, enfatizando que algumas pessoas não precisam de Teologia para o que fazem, nem para o que pretendem fazer, sobre isso discorro agora:

Quem não precisa de Teologia?

Os Falsos Apóstolos
Os “Apóstolos” de hoje sentir-se-iam ofendidos se fossem chamados de falsos apóstolos, pois se acham legítimos ministros de Cristo e seus apóstolos. Estes não precisam de Teologia, pois receberam sua autoridade diretamente de Deus, que lhes revela tudo, à semelhança dos apóstolos de Jesus Cristo, incluindo Paulo. Se acham ministros com uma mensagem restaurada de um ministério restaurado, isso parece conhecido, não? Exatamente, os mórmons aparecem nas casas com um “evangelho” restaurado, e com outro livro que afirmam ter a mesma autoridade da Bíblia.
Os Falsos apóstolos com suas doutrinas extravagantes, não precisam de Teologia, isso é coisa de “fanáticos” como Lutero, Calvino, João Wesley e outros tantos. Já se foram os tempos quando os evangélicos lutavam contra pseudo-apóstolos de fora de suas igrejas, hoje, no entanto, é uma febre ser apóstolo. Por que será que quanto mais apóstolos aparecem, tanto maior é o abuso às Escrituras, os absurdos ensinados aumentam e o impacto social diminui ao invés de aumentar, quando falo de impacto social, me refiro ao impacto positivo, como: diminuição da violência, da corrupção e etc... Não falo do impacto negativo, que na verdade tem aumentado, tal como: dólares no exterior, ensino de como arrecadar volumosas quantias de dinheiro flagrado pela TV, escândalos morais, falsas doutrinas, amuletos à semelhança do: sal grosso; banho de sal com arruda, cruz com pedra do sepulcro de Jesus, água do Jordão, ad infinitum.
Agora está pipocando de apóstolos aqui e acolá, da maneira mais natural do mundo, falta pouco para se vender apóstolos nas esquinas. Claro que apóstolos existiram, e agora vamos analisar o caso mais detalhadamente.
1° caso, Efésios 4.11: “E ele mesmo deu uns para apóstolos, e outros para profetas, e outros para evangelistas, e outros para pastores e doutores”.
Esse texto de Efésios é amplamente usado pelos defensores do “apostolado”, o texto fica mais claro quando analisado dentro do contexto geral das Escrituras, pois de outra forma seria o princípio da uma heresia. Em outro texto parecido, 1Coríntios 12.28, lemos: “E a uns pôs Deus na igreja, primeiramente apóstolos, em segundo lugar profetas, em terceiro doutores, depois milagres, depois dons de curar, socorros, governos, variedades de línguas”.
2º caso. O único fundamento
Os textos acima citados declaram a existência do ministério apostólico?
Creio que para o período sim, pois o texto diz “primeiramente apóstolos” em segundo lugar “profetas”, então deixemos a Bíblia explicar a própria Bíblia. Apóstolos e profetas são descritos como primeiro e segundo consecutivamente, porque são o fundamento. Veja o que diz Efésios 2.20: “edificados sobre o fundamento dos apóstolos e profetas, sendo ele mesmo, Jesus Cristo, a pedra angular”. Cristo é a pedra angular de esquina, e ninguém pode lançar outro fundamento (1Coríntios 3.10-11).

3º caso. Matias. Texto: Atos 1.14-26
Matias só aparece aqui.
Lançaram sortes
Não foi Cristo que o escolheu, mas foi por iniciativa de Pedro.
Mesmo assim tinha requisitos, que eram:
Ø Ter acompanhado os apóstolos, todo o tempo em que Jesus estava na terra ensinando, antes da crucificação.
Ø Desde o batismo de João até o dia da ascensão.
Ø E isso se passa no século I.
Tome outro o seu lugar (NVI) encargo (ARA), o seu Bispado (ARC). Liderança (ECA). Não diz no próprio texto usado por Pedro a palavra “Apostolado”, mas bispado, do grego “Episkopen” e não “Apostolous”, será que a Palavra se engana de cargo? Ou é de outros o engano?
Quantos apóstolos há?
Bliblicamente só 12. Veja Apocalipse 21.14.
Mas outros têm se designado apóstolos, embora não o sejam (Ap 2.2):
“Conheço as tuas obras, tanto o teu labor como a tua perseverança, e que não podes suportar homens maus, e que puseste à prova os que a si mesmos se declaram apóstolos e não são, e os achaste mentirosos”.
Barnabé e Paulo
At 14.14. “Barnabé e Paulo são chamados apóstolos” aqui o sentido de “apóstolos” é enviados, ou missionários, é só ver o contexto, no capitulo 13 eles são enviados à missão e então vão a Chipre, Antioquia da Pisídia e no capítulo 14 eles vão para Icônio, Listra e Derbe e etc... O contexto é todo da missão, assim também Barnabé é apóstolo (missionário). Eles entendiam o sentido das palavras, exatamente; o que os “Apóstolos” de hoje não entendem.
Veja a comparação: o Fulano comprou carne e fez um churrasco. Você entende o que quero dizer por “churrasco”? Creio que sim (Carne assada).
Por sua vez, o cachorro do seu Beltrano tomou um choque de 220 volts e virou churrasco (você entende?). A mesma palavra tem o mesmo uso? (obviamente que não).
Poderia dizer aos defensores dos apóstolos atuais: “entenderam ou querem que eu desenhe?”.
E Paulo?
Paulo é Apóstolo da mesma maneira que os 11 o eram, pois lá vão as suas credenciais:
Apóstolo aos gentios (Rm 11.13).
Pela vontade de Deus (1Co 1.1) não de homens (Gl 1.1).
Viu ao Senhor (1Co 9.1; cf. 9.3 e At 22.6-11, onde descreve essa situação).
Mesmo assim se considerou um abortivo=fora de tempo e isso no século I (1 Co 15.8).
Se Paulo, vendo ao Senhor, e isso no século 1º, mesmo assim considerou-se um abortivo, o que diremos dos tais “apóstolos” de hoje, quando já se passaram quase 20 séculos depois da era dos apóstolos?
2Co 13.8 – Porque nada podemos contra a verdade, senão em favor da própria verdade.
Gl 4.16 – Fiz-me, acaso, vosso inimigo, dizendo a verdade?
Quem persevera na doutrina dos Apóstolos de Cristo não segue apóstolos de araque (2Co 11.13; At 2.42).

Os Falsos Profetas
Outro grupo que chama a atenção pelo seu desprezo à Bíblia são os falsos profetas. Conheci um dia um homem que se intitulava “profeta”. Ele veio à cidade vizinha de onde eu morava, e causou grande movimento entre muitos pastores que ficaram verdadeiramente eufóricos, por ter um “profeta” visitando a cidade. Na verdade o tal “profeta”, de aparência, era muito semelhante ao personagem Tattoo da série dos anos 70 e 80 chamada: “A Ilha da Fantasia”, só que a semelhança termina aí, pois a apresentação do dito “profeta” foi ridícula, isto é, sua mensagem, se é que poderia referir-me àquilo que ele falou como uma mensagem. Seu discurso foi pedir a alguém um sapato furado (não havia ninguém, por isso não pôde prosseguir com a profecia), mandou as pessoas correr desesperadamente em volta da igreja, falou contra o estudo da teologia, afirmando que era uma verdadeira maldição, e quanto aos teólogos, ele atribuiu-lhes tantos adjetivos detestáveis que não gostaria de repeti-los.
O ministério do tal homem era, segundo ele mesmo, “levantar apóstolos em todo o mundo”, e naquela região seriam quatro ao total, apenas dois deles foram “consagrados”.
Um depende do tempo para colocar na cabeça de suas ovelhas que ele é um apóstolo, o nome do outro ficou oculto, como o último segredo de Fátima.
Usam como base de seus pseudo-ministérios alguns textos fora de contexto, analisemos as referências e vejamos se o sistema não cai.
Ef 4.11.
Como já vimos “profetas estão classificados como fundamento” juntamente com os apóstolos e Cristo. Ef 2.20.
Argumentos a favor do ministério profético:
Mórmons- citam Amós 3.5 – mas Hebreus 1.1, nos informa que antigamente era assim, agora não.
Mateus 11.13, o período dos profetas foi até João.
Mas o caso de Ágabo? (At 21.10-11). Ágabo diz que os judeus entregariam Paulo nas mãos dos gentios, mas em At 23.12-25, está escrito que os judeus o queriam matar e Paulo não foi entregue por eles, mas foi tomado, para estar em segurança.
O fundamento é posto uma única vez.
Jesus predisse que nos últimos dias viriam falsos profetas (Mt 7.15) “ acautelai-vos dos falsos profetas”.
Mateus 24.11 “ surgirão falsos profetas e enganarão a muitos”
Mateus 24.24 “Falsos cristos e falsos profetas operando sinais e prodígios, se fosse possível enganariam até mesmo os eleitos”.
1João 4.1-6.

Os Falsos Pastores
Os falsos pastores, obviamente não irão estudar Teologia, se, no entanto estudarem, é apenas para conseguir um diploma para enfeitar parede. Certa criatura humana numa ocasião disse no púlpito que o estudo mais importante era o de uma certa profissão (coincidentemente, a de um visitante, profissional liberal, que visitava a comunidade naquele dia), e desprezava a teologia dizendo que ninguém precisa dela.
Certamente tal homem não leu D.M.Lloyd-Jones ou Spurgeon, eu ficaria até mesmo muito feliz se soubesse que tal pastor lê a Bíblia.
Os falsos pastores dizem que não precisam de Teologia, pois isso acabaria com o “zelo” espiritual quem eles têm. Mataria o desejo evangelístico de sua igreja, apagaria o fogo do Espírito em suas vidas, então se tornariam mortos, vazios e prolixos.
A espiritualidade que tais homo–não–sapiens defendem nada mais é do que seu modo de vida desregrado e vaidoso, sua maior preocupação é o próprio ventre, sempre preguiçosos. Não visitam os necessitados espontaneamente, somente quando após muito choro e vela são instados, não pela consciência, pois esta já há tempos foi cauterizada. Mas pelos outros que os questionam sobre o seu trabalho pastoral.
Para que estudar Teologia, quando a internet já tem sermões preparados?
Para que estudar Teologia se a preocupação é o entretenimento?
Para que estudar Teologia quando só se fala o que o povo quer ouvir?
Para que estudar Teologia quando se recebe “mensagens eletrônicas” vindas diretamente de Deus?
O que há alguns anos atrás era deboche através do Tim Tones (Personagem interpretado por Chico Anysio), hoje vive em muitos púlpitos através de jargões infelizes e interpretações jocosas das Escrituras.
Quando Deus retirar o fôlego de vida de tais embusteiros, e então se encontrarem diante de Deus para o julgamento final, aí se verá o que parecia ser tão espiritual, quando na verdade era obra da carne, vaidade, obra de demônios e mundanismo, tudo camuflado atrás de uma gravata e paletó.
Como alguém pode perder o que não têm? Certamente há alguns teólogos que não tem compromisso nenhum com Deus, no entanto veja qual é a sua teologia, analise sua crença. Geralmente vejo pessoas sem base nenhuma de fé fazendo todo o tipo de aberração, como profetizar a uma mãe que seu filho nascerá são e forte, e dará muitas alegrias à família, será alguém bem sucedido, tudo ocorrerá bem - e no entanto a criança morreu alguns dia depois do nascimento! Quem consolará tal mãe vitimada por tal “dito ministro do evangelho”.
Boa teologia leva o ser humano a render-se aos pés de Jesus, reconhece a condição caída do homem, sua incapacidade, glorifica a Deus por ser cheio de Graça e puramente, por Deus ser Deus.
Boa Teologia fará o Pastor ir atrás da ovelha que saiu do aprisco, incentivará o zelo evangelístico (“Tenho muito povo nesta cidade”). Atos dos Apóstolos revela que a igreja testemunhava e cooperava com eles o Senhor.
Boa teologia arderá por missões, um bom exemplo é William Carey, outro bom exemplo é David Linvingstone.

Os falsos Pregadores
Um grupo que tem crescido muito em nosso solo pátrio são os falsos pregadores. Falsos, porque sua mensagem não é bíblica, discorrem sobre tudo e qualquer coisa, menos a Bíblia.
Os falsos pregadores, à semelhança dos falsos profetas, se dizem inspirados por Deus, sempre estão descobrindo algo nunca antes visto no texto sagrado, são verdadeiramente a última batatinha do pacote. No entanto o que tenho constatado é que na verdade, o que tais homens pregam, nada mais é do que pensamentos e formulações teológicas incorretas, tudo regado a muito emocionalismo e misticismo.
Muitos pregadores usam palavras de efeito para impressionar a platéia, tais como: “tem um anjo aqui” ou “receeeebaaa”, isso, nos leva a perguntar, receber o quê, afinal de contas?
Falsos pregadores às vezes querem se passar por homens muito espirituais, que têm contato direto com Deus, recebem mais “revelações” em uma semana do que Moisés em toda a sua vida, tem mais “visões” em um único dia do que todos os profetas maiores e menores juntos, durante todo o tempo de seu ministério.
Será que a Bíblia não é mais suficiente? Antes o povo corria atrás de cartomantes e videntes, para muitos que frequentam as igrejas hoje a moda mudou, pois correm atrás de “profetas” para revelar suas vidas, vivem atrás de “pregadores diferentes”, que não deixam ninguém com a consciência pesada, falando de inferno e pecado. Quer encher um auditório? Então chame um “pregador” que cobre bem para discursar e pronto, você terá um mega-evento. Ah já estava esquecendo, contrate algum cantor gospel das paradas de sucesso, para abrilhantar seu evento.
Os falsos pregadores causam um dano terrível à causa do evangelho, pois seus ensinos ludibriam o povo, não estão interessados em pregar a verdade, pois isso não lhes enche os bolsos e não lhes trará fama. São semelhantes em tudo aos falsos profetas de Israel, e também aos falsos pregadores do Evangelho como Montano e Marcião, que arrastaram muita gente após si.

Os determinadores
Os determinadores não precisam estudar teologia, pois todo o poder lhes foi dado nos céus e na terra! Para que estudar quando tudo se torna realidade determinando, ordenando e batendo o pé?
Está precisando de boa saúde? Determine, dizem eles. Precisa de um carro novo? Gere-o pela fé. Comece pensar em uma bicicleta, depois uma moto, siga a sua gestação, então agora você está com oito meses de gravidez de sua “benção” agora sim seu carro novo já está pronto para nascer. Obs: não esqueça de escolher e determinar a cor do carro e dos faróis.
Quando alguém determina e não consegue o que determinou, a culpa é dele mesma. Se não aconteceu, ou a pessoa estava em pecado ou não teve fé suficiente, a culpa nunca recai sobre o “mestre Yoda” que ensina a determinação.
Quantas pessoas se frustraram, pois caíram nas malhas dos determinadores e não conseguiram o que determinaram, com isso acabaram se frustrando com o que pensavam ser o evangelho.
É preciso ter sobriedade para lidar com as inquietações dos seres humanos, o Único que determina as coisas e elas acontecem é Deus, ninguém mais. Nós não determinamos, pedimos, imploramos - se for da vontade dEle, Ele faz (cf. 1Jo 5.14).

Os incendiários
Por incendiários refiro-me àqueles que só querem fogo. Se no culto ninguém gritou, nenhuma pessoa sentiu um arrepio na coluna, se não houve aparição de anjo nem visão de bola de fogo, o culto não foi bom, Deus não estava presente.
Os incendiários não gostam de teologia, pois, a letra mata, e o Espírito vivifica. Teologia é coisa para frios espirituais, não para tochas humanas. A liturgia de uma igreja assim seria:
Oração: fogo no altar, e anjos (hierarquias como Querubins e Serafins são preferíveis) aparecendo.
Louvor: Noiva incendiando e igreja pegando fogo, ou corinhos tais como: “há uma roda de fogo entre nós!”
Oração pelas crianças: Queima as crianças, Senhor!!!!
Pregação: vida cheia de fogo, semeando fogo, plantando fogo, colhendo fogo, e etc....
Estes do fogo, certamente não precisam de teologia, sua vida é um fogo só. Será que na eternidade eles querem ter tanto fogo assim?

Os caçadores de Maldição Hereditária
Experiência pessoal acima de tudo!!! Não importa o que a Bíblia diz, contanto que eu presencie.
Livros sobre quebra de maldição estão por toda a parte, será que é mais fácil acreditar nesta pajelança do que na Bíblia?
Tratam contingências humanas na base do espiritual. Valores; criação; exemplo não são levados em conta, na verdade nem Bíblia é levada em conta, que textos usam? Li um livro que citava talvez uns três versículos de um livro da Bíblia para justificar seu ponto de vista, os versículos foram distorcidos para afirmar o que não dizem.
De onde vêm tais doutrinas? Não da Bíblia, e sim de: entrevistas com demônios; experiências pessoais; paganismo...
Muita gente vem para a igreja e segue acreditando em suas velhas crenças, ex-macumbeiros, ex-satanistas, ex-bruxas e etc... Mal entram na igreja e já começam a dar testemunho do que fizeram, e de como exorcizar tais poderes malignos, como quebrar maldições, vínculos e tantas outras coisas estapafúrdias.
Por que alguns que dizem serem pessoas aptas para quebrar maldição hereditária continuam, eles próprios, doentes?
Jesus se fez maldição por nós ou não? “Maldito é todo o que for pendurado no madeiro”, encaramos isso como lenda ou como verdade absoluta e inquestionável? Se for encarado como lenda, prepare-se para todo o tipo de neurose possível, pois, estarão vendo suas genealogias para caçar alguma maldição, esconjurar algum demônio que tenha permissão de endemonizar alguém.
Refutação da tal doutrina nefanda de maldição hereditária:
1. Deus frustra, pela sua bênção, uma maldição já proferida (Ne 13.2: Porquanto não tinham saído ao encontro dos filhos de Israel com pão e água; antes, contra eles assalariaram a Balaão, para os amaldiçoar, porém o nosso Deus converteu a maldição em bênção. Cf. Nm 23.23 e Sl 109.28).
2. Ele livra da maldição o seu protegido e o justo que não merece (2 Sm 16.12: Porventura, o SENHOR olhará para a minha miséria; e o SENHOR me pagará com bem a sua maldição deste dia.)
3. Deus muda em maldição a bênção de um sacerdote indigno (Ml 2.2: Se não ouvirdes e se não propuserdes no vosso coração, dar honra ao meu nome, diz o SENHOR dos Exércitos, enviarei a maldição contra vós e amaldiçoarei as vossas bênçãos; e também já as tenho amaldiçoado, porque não aplicais a isso o vosso coração. Cf. Pv 3.33).
4. A eficácia da maldição ou da bênção depende do querer de Deus para que se realize e da nossa resposta humana à sua vontade (Cf. Dt 11.26-32).
Maldição não é um dizer profético negativo sobre alguém, porque isso significaria que qualquer ser humano tem poderes ilimitados para amaldiçoar e para abençoar, como nós acabamos de ver, isso não passa de um verdadeiro disparate.
Para definir as palavras “bênção” e “maldição”, precisamos recorrer à Palavra de Deus. No AT, há pelo menos 2 expressões que interpretam e definem objetivamente a palavra “maldição”. A 1ª é “anátema” (em hebraico, “herem”), que significa ser “proibido, subtraído” do uso comum e profano. O AT conhece 3 tipos de herem:
1° - o herem com promessa, pela qual o homem consagra alguma coisa a Deus (Lv 27.28). Tudo que pode ser objeto de promessa pode cair sob esse herem. Anátema, aqui, não tem sentido negativo.
2° - O herem como medida militar. Consistia na consagração da presa, às vezes de toda a presa junto com o território conquistado a Deus, para assim obter a Sua ajuda no combate (O caso de Jericó).
3° - O herem como castigo divino. Sobretudo pela idolatria, aplicado a indivíduos (Ex 20.4-6; Dt 13.13-18).
No judaísmo posterior, o anátema da sinagoga era uma pena que excluía a pessoa, temporária ou definitivamente, da participação do culto religioso.
A 2ª palavra é “ariah”, que diz respeito à deprecação, usada algumas vezes até como oração. Na Septuaginta, seu uso comum vem associado ao ato de praguejar ou murmurar (no NT, veja Rm 3.14).
No NT, há duas expressões mais comuns para “maldição”: anátema e katara. A 1ª. Anátema, é muito usada, tanto nos evangelhos como nas epístolas paulinas. Algumas vezes aparece com o sentido de:
a) Castigo. At 23.14;
b) Separação de Deus. Rm 9.3; Gl 1.8,9.
2ª. Katara. A melhor definição para essa palavra, “maldição”, é uma sentença que vem da quebra da lei moral de Deus.
Quando Deus pronuncia uma maldição, isto é, em primeiro lugar, uma denúncia contra o pecado (Nm 5.21; Dt 29.19,20).
Não se faz muito esforço para refutar a tal “doutrina” da maldição hereditária, a minha admiração é que ainda existem pessoas que acreditam em tais coisas.
Estes caçadores de maldição hereditária, com certeza não precisam de Teologia, afinal já tem toda a gnose do mundo.
Meus pensamentos e convicções levaram-me a escrever este breve artigo sobre: “quem não precisa de teologia”, certo de que como ser humano que sou, posso estar errado, porém a menos que seja corrigido pela Palavra de Deus e pela razão comum, continuo pensando da mesma forma.
Minha oração sincera a Deus é que todos os Eleitos tenham ousadia de testemunhar de sua santíssima fé nestes dias tão conturbados em que vivemos; fé essa que nos foi dada por Deus, para o louvor de Sua glória.


NOTAS:
1 . PASCAL, Blaisé. Pensamentos. Abba Press, p.138.
2 . COSTA, Hermisten. Calvino de A a Z. Vida, p. 284.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

A VIDA PARA CRISTO: O EXEMPLO DE PAULO

1. A Extraordinária Relevância de Paulo

É tarefa quase impossível escrever algo original a respeito do Apóstolo Paulo. Tantos foram os livros, artigos, ensaios, tratados e obras em geral escritos sobre o “Apóstolo da Graça” que se corre o sério risco de parecer redundante ao colocar-se diante do teclado para escrever, ainda mais quando se é um reles seminarista, “pobre, cego, ignorante e nu”! Mas, por outro lado, pesquisar e escrever sobre Paulo é um prazer! Deleitamos-nos em seus feitos, em suas assertivas apaixonadas, em sua tenacidade, em sua total e absoluta entrega ao seu Senhor que o conquistou naquela estrada poeirenta para Damasco. Ao acompanhá-lo em suas viagens pela pena de Lucas ou ao ouvi-lo em suas epístolas, não podemos deixar de nos alegrar com suas vitórias e de nos entristecer juntamente com ele em suas decepções e frustrações. E descobrimos que Paulo é humano, e que mesmo nós, que vivemos mergulhados numa sociedade hedonista e relativista, poderemos, quem sabe, experimentar o mesmo Poder espiritual que o transformou de fariseu perseguidor no maior (ou menor, como ele gostaria de ser chamado?) de todos os Apóstolos de Jesus Cristo. Se os cristãos hodiernos desejassem entregar-se a Cristo como Paulo se entregou! Se os cristãos hodiernos – se nós desejássemos nos gastar por Cristo como Paulo se gastou! Sua vida e sua teologia – entrelaçadas, unificadas, em dependência mútua – são um desafio para nós. Isaltino Gomes Coelho Filho escreveu a respeito de Paulo: “Queira Deus que ousemos ser cristãos radicais e serviçais como ele o foi. Este é o grande desafio de Paulo aos cristãos atuais: amar a Cristo e viver e estar disposto a morrer por ele”. (1)
É por isso que Paulo é absolutamente relevante para nós, como discípulos de Cristo (e leitores de Paulo) no século XXI.

2. Sua Vida Antes de Cristo e sua Conversão

Jesus é um divisor de águas na História da humanidade. Nosso calendário começa no (suposto) ano de Seu nascimento. Ele dividiu a História em antes e depois de Cristo, e dividiu também a história de nossas vidas em antes e depois de conhecê-lo.
E certamente foi assim com Paulo.
Nascido em Tarso, “cidade não insignificante” (cf. At 21.39, ARA) da Cilícia, província romana a nordeste do mar Mediterrâneo, o jovem Saul (esse era seu nome hebreu, e é assim que Jesus o chama em At 9.4) teve acesso a uma cultura cosmopolita, confluência dos mundos grego, romano e oriental, e centro financeiro importante, inclusive contando com um cais bem estruturado e eficiente (para os padrões da época), banhado pelo rio Cnido. Contava com muitas escolas onde seus cidadãos aprendiam retórica, matemática, ética, gramática e música. O próprio César Augusto havia sido educado por Atenodoro de Tarso, e escolhera outro educador daquela cidade para ser mestre de seu filho. Havia ali muitos prédios importantes, bem como estádios e ginásios, onde gregos e romanos participavam de competições atléticas. Rota entre o ocidente e o oriente, Tarso era realmente uma cidade importante. (2)
Hoje é lembrada unicamente por ter sido o berço do Apóstolo Paulo.
Do próprio Paulo temos nuances de sua esmerada educação, seja nos primeiros anos em Tarso, seja em Jerusalém, onde foi discípulo do grande rabino Gamaliel (At 22.3), que por sua vez era discípulo (ou filho, ou neto, como querem algumas tradições) de Hillel, fundador de uma escola rabínica que ensinava que o julgamento divino estava relacionado à preponderância do bem ou do mal na vida inteira de uma pessoa – bem diferente do que ensinava a outra escola famosa da época, a escola de Shammai, muito mais rígida em sua interpretação da Lei e em suas exigências (3). Seja como for, Gamaliel aparece na Bíblia como homem sensato e contemporizador, bem diferente do que seria seu jovem discípulo Saulo (cf. At 5.34-40). É em suas epístolas, e em alguns trechos de Atos, que o Apóstolo abre seu coração e revela suas ações passadas, movidas por um caráter não regenerado:
“Se alguém pensa que tem razões para confiar na carne, eu ainda mais: circuncidado no oitavo dia de vida, pertencente ao povo de Israel, à tribo de Benjamim, verdadeiro hebreu; quanto à Lei, fariseu; quanto ao zelo, perseguidor da igreja; quanto à justiça que há na Lei, irrepreensível” (Fp 3.4-6). (4)
“Persegui os seguidores deste Caminho até a morte, prendendo tanto homens como mulheres e lançando-os na prisão...” (At 22.4).
“Eu respondi: Senhor, estes homens sabem que eu ia de uma sinagoga a outra, a fim de prender e açoitar os que crêem em ti” (At 22.19).
“Eu também estava convencido de que deveria fazer todo o possível para me opor ao nome de Jesus, o Nazareno. E foi exatamente isso que fiz em Jerusalém. Com autorização dos chefes dos sacerdotes lancei muitos santos na prisão, e quando eles eram condenados à morte eu dava o meu voto contra eles. Muitas vezes ia de uma sinagoga para outra a fim de castigá-los, e tentava forçá-los a blasfemar. Em minha fúria contra eles, cheguei a ir a cidades estrangeiras para persegui-los” (At 26.9-11).
“Pois sou o menor dos apóstolos e nem sequer mereço ser chamado apóstolo, porque persegui a igreja de Deus” (1Co 15.9).
“Vocês ouviram qual foi o meu procedimento no judaísmo, como perseguia com violência a igreja de Deus, procurando destruí-la. No judaísmo, eu superava a maioria dos judeus da minha idade, e era extremamente zeloso das tradições dos meus antepassados” (Gl 1.13,14).
“... a mim que anteriormente fui blasfemo, perseguidor e insolente...” (1Tm 1.13a).
Lucas também descreve a conduta de Paulo no judaísmo perseguidor, corroborando as informações do próprio Apóstolo:
“Saulo, por sua vez, devastava a igreja. Indo de casa em casa, arrastava homens e mulheres e os lançava na prisão” (At 8.3).
“Enquanto isso, Saulo ainda respirava ameaças de morte contra os discípulos do Senhor. Dirigindo-se ao sumo sacerdote, pediu-lhe cartas para as sinagogas de Damasco, de maneira que, caso encontrasse ali homens ou mulheres que pertencessem ao Caminho, pudesse levá-los presos para Jerusalém” (At 9.1,2).
Shaul, Saul ou Saulo, o jovem hebreu apaixonado pela religião de seu povo e “extremamente zeloso” das tradições de seus antepassados, muito bem instruído na Torá, certamente destacou-se dentre os discípulos de Gamaliel. Porém sua educação não limitou-se ao conhecimento rabínico de seu povo; aquele era um judeu cosmopolita. Nascido cidadão romano (cf. At 22.22-29), o jovem Paulo (seu nome latino) soube tirar partido também de sua herança imperial. Além do hebraico e aramaico, aprendeu o grego, e possivelmente o latim. Como de praxe na educação judaica, aprendeu também uma profissão manual, e tornou-se fazedor de tendas (cf. At 18.3), ofício do qual muito se valeu durante suas jornadas missionárias. Saulo abraçou o farisaísmo (bem de acordo com sua personalidade e temperamento, aliás), “a seita mais severa da nossa religião”, como ele mesmo a descreveu ao rei Agripa (At 26.5). E certamente o fato de ser fariseu, e possivelmente membro do Sinédrio, era sem dúvida um motivo de orgulho para Saulo. Mesmo depois de sua conversão, ele, com muita inteligência, soube aproveitar-se de sua condição de fariseu (cf. At 23.6-10). (5)
Como fariseu, e dentro do judaísmo de sua época, Saul tinha um futuro brilhante pela frente. Mas o que para ele era lucro, passou a considerar como perda, depois de conhecer o brilho infinitamente maior dAquele que o chamou na famosa estrada para Damasco (cf. Fp 3.4-8). Muitas tentativas foram feitas por inúmeros pesquisadores – psicólogos, historiadores, teólogos liberais e afins – para tentar explicar a conversão de Paulo em termos “racionais”, eliminando o caráter sobrenatural do evento. Como homens não ressuscitam, certamente ele não teve um encontro real com Cristo! Desenterraram Estêvão para dizer que a consciência culpada de Paulo (cf. At 22.20) o levou a ter uma espécie de crise naquela estrada, culminando com um delírio (Dawkins???) ou alucinação. A própria Bíblia afirma que mesmo após o apedrejamento de Estêvão, Paulo ainda “respirava ameaças de morte” (At 9.1) contra os cristãos, e nem por um momento vemos em suas asseverações (algumas alistadas acima) ou no livro de Atos o menor sinal de remorso – não, antes daquele encontro na estrada, Paulo era um homem determinado a cumprir sua missão, que era, simplesmente, perseguir e destruir os seguidores do “Caminho”. A verdade é que nenhuma explicação psicológica ou liberal (ou neoliberal, ou neo-ortodoxa, ou outra aberração pseudoteológica semelhante) basta para explicar o evento na estrada para Damasco. O encontro com Jesus Cristo ressurreto mudou para sempre os planos, os sonhos, os objetivos e a vida inteira de Saul, o fariseu de Tarso.


3. Sua entrega total a Cristo

No passado distante, Deus levantou um rei para seu povo, o rei que o povo gostaria de ter. Tratava-se de um jovem alto, de porte atlético e apto para a arte da guerra, chamado Saul, da tribo de Benjamim. Ele destacou-se entre os demais jovens de sua geração e nos primeiros anos de seu reinado livrou Israel de seus inimigos. No fim, porém, voltou-se contra o Deus que o colocara no trono e mais tarde acabou substituído por outro rei, Davi, da tribo de Judá, cujo trono o Senhor prometeu firmar para sempre sobre Israel.
Chegada a “plenitude dos tempos” (cf. Gl 4.4), o prometido descendente de Davi, o Messias, da tribo de Judá, vem “tabernacular” entre o seu povo (cf. Jo 1.14). Após cumprir Sua missão na Terra, Ele retorna para os céus, de onde “voltará da mesma forma como o viram subir”, como disse o anjo (cf. At 1.11). E então Deus levanta seus apóstolos – e dentre eles um homem chamado Saul, da tribo de Benjamim, que destacava-se dentre os jovens de sua geração. Não era alto nem tinha porte atlético, a julgar pelos Atos de Paulo, apócrifo mui interessante. Mas era apto para a arte da guerra espiritual e extremamente hábil no manejo da Palavra de Deus, que corta mais profundamente do que qualquer espada romana. Os homens podem fracassar, mas o Senhor da História jamais fracassará.
Paulo entregou-se totalmente a Cristo. Não houve uma mudança gradual, uma conversão “processual” na experiência paulina. Ele saiu de Jerusalém como Saulo o fariseu perseguidor, e chegou em Damasco como outro homem. No instante mesmo em que foi atingido pelo clarão cegante, já soube o que estava acontecendo: sua mente ágil, seu intelecto privilegiado, seu conhecimento escriturístico e sua perspicácia imediatamente fizeram-lhe saber o que estava acontecendo ali. Tão perplexo estava, no entanto, que começou a esboçar a pergunta, a qual ele mesmo deu a reposta: “Quem és tu, Senhor?” (cf. At 9.5). “Na tradição rabínica, uma voz do céu como essa seria considerada a voz do próprio Deus. A repetição solene do nome de Saulo e a luz brilhante lhe mostraram que era possível estar na presença da deidade” (6).
Saulo foi conquistado por Cristo. Ali naquela estrada, ele percebeu que tudo o que ele era – hebreu de hebreus, fariseu, membro do Sinédrio, cidadão romano, equipado com a cultura mais avançada de sua época – reduzia-se a nada diante daquele esplendor ofuscante. Tudo o que ele conquistara na vida reduzia-se a nada diante daquela voz poderosa que o questionava. Todos os seus sonhos, seus planos e seu projeto de vida caíram por terra naquele instante. Pobre, miserável, cego e nu – mergulhado nas trevas da cegueira, Paulo viu claramente sua condição abjeta e miserável diante dAquele que lhe aparecera.
“Saulo falaria disso mais tarde como a última das aparições de Jesus aos seus seguidores após a ressurreição (1Co 15.8). (...) Para o rabino de Tarso, era concedida uma entrevista com o Cristo ressurreto”(7).
Nesse dia Saulo morreu. Morreu o hebreu de hebreus, morreu o fariseu, morreu o sábio, morreu o rabino, morreu o membro do Sinédrio, morreu o cidadão romano. A vida de Saulo de Tarso terminou naquela estrada, sob o fulgor daquela luz. A partir daí, “fui crucificado com Cristo. Assim, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim. A vida que agora vivo no corpo, vivo-a pela fé no filho de Deus, que me amou e se entregou por mim” (Gl 2.20). A partir daí, “que eu jamais me glorie, a não ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, por meio da qual o mundo foi crucificado para mim, e eu para o mundo” (Gl 6.14).
A partir daí nasceu “Paulo, escravo de Cristo Jesus, chamado para ser apóstolo, separado para o evangelho de Deus” (cf. Rm 1.1).
Não mais o digníssimo membro do Sinédrio, mas o escravo de Cristo Jesus. Não mais o rabino de Tarso, discípulo de Gamaliel, mas aquele que fora chamado para ser apóstolo. Não mais o fariseu – agora ele havia sido separado para o evangelho de Deus.
Como ele viveu a partir daí? Novamente ele mesmo responde a partir de suas epístolas (note bem a força destas asseverações, colocadas em seqüência):
“Porque me parece que Deus nos colocou a nós, os apóstolos, em último lugar, como condenados à morte. Viemos a ser um espetáculo para o mundo, tanto diante de anjos como de homens. Nós somos loucos por causa de Cristo, mas vocês são sensatos em Cristo! Nós somos fracos, mas vocês são fortes! Vocês são respeitados, mas nós somos desprezados! Até agora estamos passando fome, sede e necessidade de roupas, estamos sendo tratados brutalmente, não temos residência certa e trabalhamos arduamente com nossas próprias mãos. Quando somos amaldiçoados, abençoamos; quando perseguidos, suportamos; quando caluniados, respondemos amavelmente. Até agora nos tornamos a escória da terra, o lixo do mundo” (1Co 4.9-13).
“Vocês não sabem que aqueles que trabalham no templo alimentam-se das coisas do templo, e que os que servem diante do altar participam do que é oferecido no altar? Da mesma forma, o Senhor ordenou àqueles que pregam o evangelho, que vivam do evangelho. Mas eu não tenho usado de nenhum desses direitos (...). Qual é, pois, a minha recompensa? Apenas esta: que, pregando o evangelho, eu o apresente gratuitamente, não usando, assim, dos meus direitos ao pregá-lo. Porque, embora seja livre de todos, fiz-me escravo de todos, para ganhar o maior número possível de pessoas. Tornei-me judeu para os judeus, a fim de ganhar os judeus (...) Para os que estão sem lei, tornei-me como sem lei (embora não esteja livre da lei de Deus, e sim sob a lei de Cristo), a fim de ganhar os que não têm a Lei. Para com os fracos, tornei-me fraco, para ganhar os fracos. Tornei-me tudo para com todos, para de alguma forma salvar alguns. Faço tudo isso por causa do evangelho, para ser co-participante dele” (1Co 9.13-15, 18-20a, 21-23).
“Se enlouquecemos, é por amor a Deus; se conservamos o juízo, é por amor a vocês. Pois o amor de Cristo nos constrange, porque estamos convencidos de que um morreu por todos; logo, todos morreram. E ele morreu por todos para que aqueles que vivem já não vivam mais para si mesmos, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou. De modo que, de agora em diante, a ninguém mais consideramos do ponto de vista humano. Ainda que antes tenhamos considerado Cristo dessa forma, agora já não o consideramos assim. Portanto, se alguém está em Cristo, é nova criação. As coisas antigas já passaram; eis que surgiram coisas novas!” (2Co 5.13-17).
“Não damos motivo de escândalo a ninguém, em circunstância alguma, para que o nosso ministério não caia em descrédito. Ao contrário, como servos de Deus, recomendamo-nos de todas as formas: em muita perseverança; em sofrimentos, privações e tristezas; em açoites, prisões e tumultos; em trabalhos árduos, noites sem dormir e jejuns; em pureza, conhecimento, paciência e bondade; no Espírito Santo e no amor sincero; na palavra da verdade e no poder de Deus; com as armas da justiça, quer de ataque, quer de defesa; por honra e por desonra; por difamação e por boa fama; tidos por enganadores, sendo verdadeiros; como desconhecidos, apesar de bem conhecidos; como morrendo, mas eis que vivemos; espancados, mas não mortos; entristecidos, mas sempre alegres; pobres, mas enriquecendo muitos outros; nada tendo, mas possuindo tudo” (2Co 6.3-10).
Falando dos “superapóstolos” que os coríntios tanto prezavam e que se gloriavam comparando-se com Paulo, ele replica: “São eles hebreus? Eu também. São israelitas? Eu também. São descendentes de Abraão? Eu também. São eles servos de Cristo? – estou fora de mim para falar dessa forma – eu ainda mais: trabalhei muito mais, fui encarcerado mais vezes, fui açoitado mais severamente e exposto à morte repetidas vezes. Cinco vezes recebi dos judeus trinta e nove açoites. Três vezes fui golpeado com varas, uma vez apedrejado, três vezes sofri naufrágio, passei uma noite e um dia exposto à fúria do mar. Estive continuamente viajando de uma parte a outra, enfrentei perigos nos rios, perigos de assaltantes, perigos dos meus compatriotas, perigos dos gentios; perigos na cidade, perigos no deserto, perigos no mar e perigos dos falsos irmãos. Trabalhei arduamente; muitas vezes fiquei sem dormir, passei fome e sede, e muitas vezes fiquei em jejum; suportei frio e nudez. Além disso, enfrento diariamente uma pressão interior, a saber, a minha preocupação com todas as igrejas. Quem está fraco, que eu não me sinta fraco? Quem não se escandaliza, que eu não me queime por dentro? Se devo orgulhar-me, que seja nas coisas que mostram a minha fraqueza. O Deus e Pai do Senhor Jesus, que é bendito para sempre, sabe que não estou mentindo. Em Damasco, o governador nomeado pelo rei Aretas mandou que se vigiasse a cidade para me prender. Mas de uma janela na muralha fui baixado numa cesta e escapei das mãos dele” (2Co 11.22-33).
“Por isso, por amor de Cristo, regozijo-me nas fraquezas, nos insultos, nas necessidades, nas perseguições, nas angústias. Pois, quando sou fraco é que sou forte” (2Co 12.10).
“Sei o que é passar necessidade e sei o que é ter fartura. Aprendi o segredo de viver contente em toda e qualquer situação, seja bem alimentado, seja com fome, tendo muito, ou passando necessidade. Tudo posso naquele que me fortalece” (Fp 4.12,13).
Isso tudo se parece com o modo como vivem aqueles que hoje se proclamam “apóstolos”? Isso se parece com o modo como vive a maioria dos cristãos de hoje em dia? Se parece com o que é pregado, ensinado e vivenciado na maioria das igrejas “evangélicas”? Se parece com o modo como vivemos nós?
Existe cristianismo autêntico hoje, como podemos ver claramente em Paulo? Existe cristianismo autêntico em nossas vidas? Podemos dizer, como Paulo: “Já não vivo eu, mas Cristo vive em mim”? Podemos afirmar juntamente com ele: “fiz-me escravo de todos”???
Se não podemos, precisamos urgentemente rever nosso Cristianismo!



4. O Impacto de Paulo na vida da Igreja, hoje

A identificação de Paulo com Cristo foi tão grande que ele não pôde fazer menos do que identificar a Igreja como o “corpo” de Cristo. Essa é a metáfora mais distintiva de Paulo para a Igreja, enfatizando a unidade dos crentes com Cristo e a interdependência e relação dos crentes uns com os outros. Essa solidariedade dos crentes com seu Senhor é claramente um reflexo da doutrina do próprio Jesus (cf. Mt 10.40; 25.40) e da experiência cristã de Paulo. Ele preserva uma clara distinção entre a Igreja e Cristo, porém utiliza a metáfora de “corpo de Cristo” para descrever o tipo de vida e atividade que a Igreja deve exercer no mundo. Ele muda um pouco essa idéia nas epístolas da prisão, onde descreve Cristo como o cabeça do corpo (Ef 4.15; Cl 1.18), de onde o corpo obtém seu crescimento (Cl 2.19). Com isto ele pretende assentar claramente a dependência absoluta da Igreja, por toda a sua vida e desenvolvimento, de Cristo. Além disso chama Cristo de “cabeça” para ressaltar Sua supremacia sobre todas as coisas (Ef 1.22). Ora, há um corpo, não muitos “corpos” de Cristo. Para Paulo, existe somente uma Igreja, porque há somente um Cristo (Ef 4.4-6). Esta unidade, porém, subsiste em inesgotável diversidade, como a metáfora do corpo nos ensina. É uma unidade que exclui toda e qualquer divisão (1Co 1.13), que se expressa em preferência humilde de um para com o outro (Rm 12.3); em amor e afeição mútuos (1Co 12.25,26) e destrói todo preconceito racial, social, sexual, cultural ou econômico (Gl 3.26-28; Ef 2.16), excluindo aberrações doutrinárias e religiosas (Cl 2.18,19). (8)
Essa unidade inquebrantável da Igreja somente existe por causa de Cristo, porque a Igreja também morreu com Cristo, foi crucificada com Cristo, e já não vive mais para si mesma, mas para Cristo. Essa unidade somente é possível porque o mundo foi crucificado para a Igreja, e a Igreja, para o mundo. Essa unidade somente é possível porque um morreu pela Igreja, portanto, a Igreja morreu para si a fim de viver para Cristo. Essa unidade somente é possível porque o amor de Cristo constrange a Igreja e faz com que a Igreja desempenhe na Terra o papel de Cristo.
Em outras palavras, a Igreja somente é viável se viver como Igreja, se viver como Paulo viveu. Em suas epístolas temos a descrição fiel da vida para Cristo.



5. Conclusão

A Igreja precisa sair para fora de si mesma, assim como Paulo saiu para fora de si mesmo. Precisamos, como Igreja, esvaziar-nos de nós mesmos para encher-nos do Espírito Santo, do Espírito de Cristo. Há muito a aprender com Paulo.
A teologia paulina é a teologia da cruz, da morte do eu e da vida para Cristo e para os outros. É a teologia da fé, da esperança e do amor, porque Cristo nos concede tudo isso e muito mais. A vida de Paulo é uma demonstração contundente de sua teologia. Ele viveu o que ensinou, o que pregou. Sua morte é também uma demonstração de sua teologia. Ele morreu do modo como viveu – Paulo anulado, Paulo cancelado, Paulo conquistado por Cristo. E ao mesmo tempo Paulo rico, riquíssimo – dono do maior tesouro de todos os tempos: Jesus. Por amor a Cristo ele sofreu a perda de todas as coisas – mas achou um tesouro, como diz a letra da música “Por amor a Cristo”, de Adhemar de Campos (faixa 2 do CD Cantando a Palavra, em comemoração aos 50 anos da Sociedade Bíblica do Brasil). Esse tesouro é Jesus, o “tudo” de Paulo.
“Todavia, não me importo, nem considero a minha vida de valor algum para mim mesmo, se tão-somente puder terminar a corrida e completar o ministério que o Senhor Jesus me confiou, de testemunhar do evangelho da graça de Deus” (At 20.24).
“Eu já estou sendo derramado como uma oferta de bebida. Está próximo o tempo da minha partida. Combati o bom combate, terminei a corrida, guardei a fé. Agora, me está reservada a coroa da justiça, que o Senhor, justo Juiz, me dará naquele dia; e não somente a mim, mas também a todos os que amam a sua vinda” (2Tm 4.6-8).
Paulo identificou-se com seu Senhor que o conquistou na estrada para Damasco a ponto de proclamar: “trago em meu corpo as marcas de Jesus” (cf. Gl 6.17). Se a Igreja é o corpo de Cristo, precisa mostrar também essas marcas. Se quisermos ser verdadeiros discípulos de Cristo como Paulo foi, precisamos mostrar ao mundo as marcas de Cristo em nossas vidas. Campbel Morgan, citado por John Stott, escreveu: “Só o homem crucificado pode pregar a cruz. (...) Só o homem que morreu com Cristo pode pregar a cruz de Cristo” (9).
Paulo certamente foi esse homem, e nós também precisamos sê-lo, se quisermos ser verdadeiramente parte do corpo de Cristo, a Igreja.
O Apóstolo foi executado sob Nero, em Roma, após uma vida de serviço abnegado e extraordinário ao seu Senhor e Salvador. Mas ele continua falando hoje, dois mil anos depois, e nos ensinando a viver a vida cristã. Sua memória viverá para sempre, enquanto houver mundo, enquanto houver Igreja. Paulo foi decapitado por ordem do Imperador de Roma – o homem mais poderoso de sua época - mas recebido na glória celestial do Rei do Universo, o Deus Onipotente. Condenado por um déspota insano, recebido pelo Senhor da Glória. E sobre a condenação do Apóstolo de Cristo por um imperador romano, T.R. Glover comentou que viria o dia em que as pessoas chamariam seus cachorros de Nero – e seus filhos de Paulo. (10)



NOTAS

(1). REGA, Lourenço Stelia (org.). Paulo, sua vida e sua presença ontem, hoje e sempre. São Paulo: Editora Vida, 2004. p. 31.
(2). BALL, Charles Ferguson. A Vida e os Tempos do Apóstolo Paulo. Rio de Janeiro: Casa Publicadora das Assembléias de Deus, 1998. p. 7-11.
(3). BRUCE, F.F. Paulo: o apóstolo da graça, sua vida, cartas e teologia. São Paulo: Shedd Publicações, 2003. p. 44-46.
(4). Todas as citações bíblicas, salvo indicação em contrário, são da Nova Versão Internacional (NVI), publicada pela Sociedade Bíblica Internacional e pela Editora Vida.
(5). Cf. o ensaio de Luiz Alberto Sayão, in REGA, Lourenço Stelio (org.). Op.cit., p. 98-99.
(6). Bíblia de Estudo NVI, São Paulo: Editora Vida, 2003. p. 1868 (nota sobre At 9.5).
(7). BALL, Charles Ferguson. Op. cit. p. 64.
(8). LADD, George Eldon. Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Hagnos, 2001. p. 504-506.
(9). STOTT, John. A Cruz de Cristo. São Paulo: Editora Vida, 1998. p. 325.
(10). BRUCE, F.F. Op. cit. p. 07.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

DECIDI SEGUIR A CRISTO

Decidi seguir a Cristo. Cansei de seguir meu próprio caminho, tropeçando no escuro, tateando nas trevas, correndo o risco de escorregar nas pedras e despencar no abismo a qualquer momento.
Decidi seguir a Cristo. Cansei de preocupar-me com o dia de amanhã, de perder o sono por causa de meus medos e meus fracassos, de correr atrás do vento, de quimeras e ilusões.
Decidi seguir a Cristo. Cansei de correr sem rumo, de viver sem razão, de andar a esmo.
Decidi seguir a Cristo. Cansei de tentar planejar meu futuro, de nadar contra a corrente, de calcular o custo, de depender de mim mesmo. Decidi seguir a Cristo.
Agora sigo o caminho dele, à luz do dia que já raiou. Se tropeço, ele me ajuda a levantar. Já não ando à beira do abismo, agora meus pés pisam terra firme, uma verdadeira rocha. Como é bom seguir a Cristo!
Agora não me preocupo com o dia de amanhã, porque sei que amanhã ele estará comigo assim como está hoje, assim como sempre esteve. Meus antigos temores já não me assustam mais, e não temo mal algum, porque ele está comigo. Meus fracassos e derrotas já não me trazem vergonha e remorso, porque ele me fez nascer de novo, perdoou meus pecados e tornou o mal em bem. Já não corro atrás do vento, nem perco tempo com ilusões, porque ele mostrou-me uma realidade maravilhosa, e concedeu-me a graça de servi-lo. Como é bom seguir a Cristo!
Agora também não corro sem rumo: tenho um alvo bem definido, um objetivo, uma razão para viver e morrer, um caminho seguro a trilhar. Como é bom seguir a Cristo!
Agora meu futuro pertence a ele, como tudo o mais na minha vida - passado, presente, futuro, o que fui, o que sou, o que serei, o que tive, o que tenho, o que terei. Tudo é dele, por ele e para ele - ele é que sabe os planos que tem para mim, ele é que constrói meu futuro. Eu só preciso segui-lo. Ele me fortalece em todos os momentos para que eu continue nadando contra a correnteza deste mundo; não me canso mais. Ele me libertou do mundo, do pecado, do diabo e de mim mesmo, de meu egocentrismo monstruoso, de meu egoísmo insensível. Não dependerei jamais de mim mesmo. Dependo dele para tudo, sempre dependerei, porque sei que ele jamais me desamparará, jamais me prejudicará, jamais me decepcionará, jamais permitirá que eu volte a ser como era antes de conhecê-lo. Como é bom seguir a Cristo!